Papo Psi

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"Sou meu próprio líder ando em círculos, me equilibro entre dias e noites, minha vida toda espera algo de mim, meio sorriso, meia-lua toda tarde..." (Renato Russo). E assim que me descrevo busco ser autora da minha vida e brilhar sempre no palco da vida, apesar das intempéries.Almejo sempre meu equilíbrio e paz interior numa compreensão mútua. O que faço:Graduanda de Psicologia da Faculdade Santíssimo Sacramento, hoje no 9º semestre e Sargento da Polícia Militar.

domingo, 11 de novembro de 2012

Precisamos falar sobre Kevin



Fatores socioeconômicos, institucionais, culturais, biológicos, midiático, globalização, síndrome do pequeno poder, relações parentais são alguns dos fatores responsáveis pelo desencadeamento da violência. Domenach (1981) diz que, a violência está inserida e arraigada nas relações sociais, não podendo ser considerada apenas como uma força exterior aos indivíduos e grupos que a eles se impõe. Arendt (1990) relata que a violência tem um caráter instrumental, ou seja, é um meio e como meio necessita de orientação e justificação dos fins que persegue.
A violência está relacionada à estrutura social, por ser estrutural ela deriva da maneira como a sociedade (capitalista) organiza os meios de produção e de consumo. A violência estrutural ou institucional está atrelada a forma como as estruturas sociais podem aplicar uma força que retire as pessoas de seu estado ou situação ou que lhes obrigue a atuar contra o seu sentir e parecer. Este tipo de violência se reproduz em diversos momentos do fazer humano. Por exemplo: a violência que acontece no ambiente familiar reproduz uma violência estrutural, já instalada, sendo uma violência que se reveste de um caráter benéfico, ou seja, ela induz aos que são agredidos para que não a percebam como “violência”, mas sim como um estado natural, esperado pela sociedade, tido como “normal”, pois seria uma “justificação”, ou seja, é o valor que é dado a um ato violento e que o torna aceitável, em uma determinada sociedade.
Ela ainda pode ser entendida como o resultado das condições históricas e sociais que o ser humano passou, sendo esta atrelada à forma de organização da vida social. O que faz com que o indivíduo a interprete, como algo natural, em determinados contextos e em outros não. Sendo possível deduzir que a violência não está limitada apenas a atos agressivos, pautados na utilização da força física, mas também mostra seu vigor através de atos coercitivos, como a violência psicológica e a negligência. Além disso, o fenômeno está totalmente associado à realidade social e sempre é desempenhada tendo em vista o alcance de um objetivo, uma finalidade específica, inclusive a finalidade econômica, ou “apenas” a submissão.
Ao analisar, o filme: Precisamos falar sobre o Kevin, percebe-se que o ato violento do adolescente é o produto da relação mútua, em que o agressor e agredido interagem de maneira contínua, com interesses conflitantes. No processo de desencadeamento de um ato violento não deve deixar de levar em consideração os aspectos familiares, ambientais, circunstanciais, os eventos objetivos, subjetivos, conscientes e inconscientes. Sendo este, entendido como o resultado do construto social, em que as sensações e sentimentos corporais se originam em parte de estímulos externos, em parte de estímulos internos, nas representações e pensamentos, como também por motivo de doença.
O que caracteriza o ser-no-mundo de cada indivíduo provém da maneira com este dá significado às experiências e de como elas são significadas em função do aprendizado, formal e informal, e do potencial biológico (genético e ambiental) de cada um. A criança no início de sua aprendizagem formal deve apresentar: a) maturidade intelectual; b) emancipação emocional de seus pais, com a possibilidade de uma interação extrafamiliar e c) capacidade para controlar seus afetos e suas respostas emocionais, bem como a resistir a frustrações e a demanda do meio.
Um ato de violência é uma resposta que a depender do contexto cultural é percebida como “normal” ou “anormal”. No caso de Kevin, percebe-se que ele possuía maturidade intelectual, porém lhe faltou regras, limites, lei, mesmo com os esforços empreendidos pela mãe para recuperar o vínculo afetivo com o filho. Sabe-se que a base psicológica da personalidade infantil são os pais, quando existe uma deficiência nessa base há o desencadeamento de diversos tipos de personalidades. Kevin se caracterizou como ser-no-mundo como um produto das relações entre o plano genético e das suas experiências pessoais era uma “bomba” ambulante, em que suas ações sempre tinham como objetivo tirar proveito em algo e machucar a sua genitora.
 Por personalidade entende-se como aquilo que “somos”, que nos constitui, e isso inclui comportamentos, sentimentos, ações e as maneiras como percebemos e lidamos com o outro. A formação dessa personalidade, ou estrutura, ocorre durante longos anos da nossa existência sendo um processo gradual, complexo e contínuo, que tem início na infância se reafirmando na adolescência, chegando à fase adulta como um padrão consistente na relação com o meio, em que a família, religião, valores e educação têm um papel importante nessa formação.
 Nessa perspectiva está Kevin num contexto familiar em que não existem regras, limites, com figuras parentais que constroem a sua personalidade de forma patológica gerando um indivíduo com prejuízo na adaptação e na relação com o meio, produzindo sofrimento psíquico para ele e para os que o cercam. As percepções que Kevin faz de si e dos outros está totalmente alterada e mal adaptada, apresentando uma falha de conduta, sendo danoso para si e para os outros. Ele de certa forma quis devolver a sua mãe toda a repulsa inicial que ela havia lhe transmitido em quando este era bebê, deixando-a através do seu ato de violência a mercê do julgamento da sociedade e principalmente na busca de entender o que se passou e onde ela poderia ter falhado em sua educação.
Dessa forma, ao confrontar o conceito de violência e o filme percebe-se que a violência muitas vezes está escondida numa relação de dominação de um pólo sobre o outro, mantida através de instrumentos ou meios de dominação, que são em grande parte subliminares. Esse fenômeno é, assim, algo que foi sendo construído durante a história social do homem e que, por conseguinte, está relacionado com a forma de apropriação e objetivação da cultura pelo indivíduo. O ato violento de Kevin desencadeou-se a partir de sua predisposição genética estimulada pelas contingências ambientes e culturais que condicionaram o seu comportamento agressivo, dramático, mentiroso e imprevisível, bem como a sua forma de estar no mundo.

Referências

Precisamos falar sobre o Kevin. Direção: Lynne Ramsay, Drama, 110min, 2011.